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AS OMISSÕES E INCONGRUÊNCIAS DA NOVA LEI GERAL DO TRABALHO

Atualizado: 30 de set.


I.              INTRODUÇÃO

 

No dia 1 de Março, foi publicada em Diário da República, a Rectificação n.º 2/24, em função da inexactidão, de substância ou conteúdo na Lei n.º 12/23, 27 de Dezembro de 2023, que a aprova a Nova Lei Geral do Trabalho, adiante “NLGT”.

 

Com esta Rectificação, que há muito se aclamava, surgiram outros apelos e indagações, como por exemplo: (i) O legislador poderia ter sido mais abrangente; (ii) não se falou nada sobre a medida disciplinar de Despromoção Temporária de Categoria, entre outras. Assim, nesta breve reflexão abordaremos a figura da “Rectificação”, no âmbito legislativo, algumas omissões e incongruências constantes na NLGT.

 

II.     DO OBJECTO DAS RECTIFICAÇÕES

 

A figura da Rectificação, objecto da nossa análise, encontra-se regulada na Lei n.º 7/14 de 26 de Maio, Lei Sobre Publicações Oficiais e Formulários Legais. Nos termos do n.º 1 do art.º 9.º do referido diploma, “São admissíveis rectificações, correcções e erratas de qualquer acto legislativo ou normativo ou outro acto que vise a correcção de erros materiais ou formais, resultantes de divergências entre o texto original remetido e o texto publicado”. Disto resulta que uma rectificação incidirá, em princípio, unicamente sobre erros materiais ou formais que resultem de  divergências entre o texto original remetido e o texto publicado. Dito doutro modo, só podem, em princípio, ser rectificados conteúdos já constantes do texto original remetido à Imprensa Nacional. Assim, se da versão original não constar a regulamentação de determinada matéria, esta não poderá ser regulamentada em sede de rectificação.

 

Considerando que a rectificação foi omissa a um conjunto de temática relevantes, que carecem de melhor regulamentação, podemos concluir que tais matérias foram insuficientemente tratadas no texto original. Assim, para um ajuste profundo de determinadas figuras da NLGT é recomendável a aprovação de uma Lei de Alteração (art.º 10.º da Lei n.º 7/14 de 26 de Maio, Lei Sobre Publicações Oficiais e Formulários Legais).

 

No essencial, a Rectificação n.º 2 /24 corrigiu erros de escrita, de remissão, de omissão de prazos[1] e suprimiu frases para estabelecer melhor o sentido de determinados artigos. É digno de nota que, nos termos do n.º 6 do art.º 9.º do diploma referido, “a eficácia das declarações de rectificação retroage à data da entrada em vigor do texto rectificado, salvo os efeitos jurídicos produzidos no período de tempo entretanto decorrido”.


III.              DAS OMISSÕES E INCONGRUÊNCIAS NA NLGT

 

Apesar de ser um diploma, de uma maneira geral, tido como consensual, por aproximar os principais pontos de divergência entre a classe dos trabalhadores e dos empregadores, a NLGT contém igualmente algumas omissões e incongruências relevantes, que passaremos a elencar.

 

1.     MEDIDAS DISCIPLINARES

 

O legislador consagrou 2 medidas disciplinares novas, nomeadamente, a Despromoção Temporária de Categoria e a Suspensão do Trabalho com Perda Parcial de Retribuição. Entretanto, no que se refere à primeira, o legislador nada mais disse além de determinar o nome. Esta omissão tem feito com que vários pensadores encontrem soluções para este problema, como por exemplo: i) aplicação do regime consagrado na Lei de Bases da Função Pública[1]; ii) despromover um único degrau em relação à função exercida pelo trabalhador, durante o tempo que o legislador permite para outras medidas constantes da NLGT. No caso da Suspensão do Trabalho com Perda Parcial de Retribuição, o legislador fala em perda parcial, mas permite que a suspensão ocorra até 30 dias, por cada infracção, e 60 dias em cada ano civil (n.º 3 do art.º 87.º da NLGT). Estando o trabalhador suspenso por 30 dias, a consequência imediata será a perda total e não parcial da remuneração naquele período. Ainda sobre esta medida, a maior incongruência resulta no estipulado no n.º 4 do referido artigo, que dispõe que “os valores dos salários não pagos ao trabalhador, em virtude da… suspensão… são depositados pelo empregador na conta da Segurança Social… devendo incidir também sobre esses valores as contribuições do trabalhador e do empregador para a Segurança Social”. Ora, apesar de o empregador ficar privado do trabalho do trabalhador, ele ainda assim terá custos com a respectiva remuneração, devendo proceder ao depósito junto do Instituto Nacional de Segurança Social “INSS”. Resumidamente, o empregador fica mais onerado aplicando esta medida do que qualquer outra.

 

Nestes termos, considerando as problemáticas que se levantam em torno das medidas de Despromoção Temporária de Categoria e Suspensão do Trabalho com Perda Parcial de Retribuição, não recomendamos a sua aplicação até que sejam objecto de melhor regulamentação pelo legislador.

 

2.     PROIBIÇÃO DO EXERCÍCIO DO PODER DISCIPLINAR DURANTE AS FÉRIAS

 

Apesar de concordarmos com esta opção, o legislador foi omisso quanto ao efeito suspensivo do prazo para o exercício do poder disciplinar durante as férias. Acreditamos que será uma consequência lógica, em função do justo impedimento que o empregador terá, principalmente se o trabalhador receber a notificação da convocatória antes de sair de férias e o prazo para a realização da entrevista, por exemplo, coincidir com o período de gozo de férias. Entretanto, é recomendável que, sempre que possível, o legislador seja suficientemente claro.


3.      AUTORIZAÇÃO DA INSPECÇÃO GERAL DO TRABALHO NA PRORROGAÇÃO DO PRAZO PARA ALÉM DO LIMITE, NOS CONTRATOS POR TEMPO DETERMINADO

 

Como sabemos, a Inspecção Geral do Trabalho “IGT” poderá autorizar o prolongamento da duração do contrato para além de 36 meses[1], mediante requerimento fundamentado da entidade empregadora, até 30 dias antes do termo, acompanhado de declaração de concordância do trabalhador, nos seguintes casos e situações:

 

a) Substituição de trabalhador temporariamente ausente | Se o regresso do trabalhador temporariamente ausente não tiver lugar dentro daquele prazo;

 

h) Desempregado há mais de um ano ou elementos doutros grupos sociais abrangidos por medidas legais de inserção ou reinserção na vida activa | Se as medidas legais de política de emprego dos grupos sociais estiverem ainda em aplicação à data de termo dos 36 meses do contrato;

 

j) Execução, direcção e fiscalização de trabalhos de construção civil e obras públicas, montagem e reparações industriais e outros trabalhos de idêntica natureza e temporalidade | Se a duração dos trabalhos de construção civil e actividades equiparadas for ou se tornar superior a três anos;

 

A problemática, neste caso, prende-se com o facto de a NLGT nada disser no caso de a IGT não responder ao pedido do empregador antes do esgotamento do prazo do contrato. É nosso entendimento de que, neste caso, teremos um deferimento tácito, nos termos regulados pelo Código do Procedimento Administrativo.[2]

 

4.      REGIME DE SUCESSÃO DE CONTRATOS POR TEMPO DETERMINADO E SITUAÇÕES SIMILARES

 

A NLGT não estabelece um regime de sucessão de contratos por tempo determinado celebrados com o mesmo trabalhador. Por exemplo, ser o contrato celebrado por tempo determinado com fundamento na al. a) do n.º 1 do art.º 15.º da NLGT, e, mais tarde, existindo necessidade do empregador, ser celebrado um outro contrato por tempo determinado com fundamento na al. b) do n.º 1 do art.º 15.º da NLGT. Além disso, a NLGT também é omissa quanto ao tempo que um trabalhador, que já foi contratado por tempo determinado, deve ficar fora da empresa, antes de ser novamente contratado com o mesmo fundamento e pelo mesmo empregador, em caso de necessidade. Nestes casos, recomendamos a observância de um “período de nojo” de, pelo menos, 3 meses.

 

IV.              CONCLUSÃO

 

Como vimos, apesar de ser um diploma consensual, a NLGT apresenta várias omissões e incongruências relevantes. Conseguimos ver que, a rectificação de um diploma incidirá, em princípio, unicamente sobre erros materiais ou formais que resultem de divergências entre o texto original remetido e o texto publicado. Considerando que a rectificação foi omissa a um conjunto de temática relevantes, que carecem de melhor regulamentação, podemos concluir que tais matérias foram insuficientemente tratadas no texto original. Assim, para um ajuste profundo de determinadas figuras da NLGT é recomendável a aprovação de uma Lei de Alteração (art.º 10.º da Lei n.º 7/14 de 26 de Maio, Lei Sobre Publicações Oficiais e Formulários Legais). Até que se efective a alteração da lei, todos os pensadores e aplicadores do Direito são chamados para estabelecer o melhor sentido de várias omissões ou incongruências consagradas na NLGT.




[1] A Rectificação estabeleceu 36 meses como limite máximo de duração dos contratos celebrados com fundamento na al. i) do n.º 1 do art.º 15.º da NLGT, nomeadamente “Execução de tarefas bem determinadas, periódicas na actividade da entidade empregadora, mas de carácter descontínuo”.


[2] Posição defendida pelo advogado Delmiro Ymbi, que, no entanto, é criticada por procurar uma integração de lacuna a desfavor do trabalhador em matéria sancionatória.


[3] Solução semelhante encontra-se na al. b) do n.º 3 do no art.º 283.º da NLGT.


[4] O prolongamento da duração do contrato não pode ser autorizado por mais de 24 meses (n.ºs 2, 3 e 4 do art.º 16.º da NLGT).

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